sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Inflação

     Ontem foi divulgado o IPCA de janeiro/2013 que apresentou uma variação de 0,86%.  A notícia mais que esperada, afinal a mais de um mês o mercado esperava que a inflação ficaria acima de 0,80%, causou furor.  Para completar a declaração da autoridade monetária de que o patamar da inflação não é confortável  fez as taxas de juros futuros dispararem, contribuindo para os movimentos de baixa na bolsa e no dólar.

       Eu, apesar de meus mais de 20 anos em mesas de operação, não consigo deixar de achar graça na tragédia...   Por dever de ofício leio todos os documentos do Banco Central relacionados às metas de inflação.  Assim, sempre acreditei que certas manifestações deveriam ser guardadas para serem feitas através destes documentos, principalmente no Relatório de Inflação, nos Comunicados e Atas das reuniões do COPOM.   Isso diminuíra e bem o ruído.

         Enfim, tenho repetidamente falado que o maior defeito da política econômica no Brasil é a comunicação !

        O que mais me admira é a reação dos mercados à algo mais do que esperado, já que o número divulgado do IPCA ficou dentro das expectativas.  Mas, por mais interessantes que sejam as reações elas são pouco importantes, pois o que importa são os fundamentos !

            Falando em fundamentos acho importante fazer uma diferença clara entre "processo inflacionário" e alta no índice de preços, que muitas vezes são tidos por sinônimo.  Embora extremamente relacionados, uma coisa e não tem nada a ver com a outra. Vamos a um exemplo de padaria.

              Suponhamos que existam 5 produtos na economia e que são vendidos na padaria do seu Matsunaga: pão, óleo, leite, refrigerantes e cigarros.  E que em dado momento o preço de cada um deles era de R$ 1.  Supondo pesos iguais e constantes, podemos dizer que o IPPM (índice de preços da padaria do Matsunaga) era de 5 (igual a somatória do preço de cada produto).   Suponhamos que, certo dia, o ministro da fazenda, decidiu estabelecer um imposto de 100% sobre o cigarro, logo o preço do cigarro subiria para R$ 2.  E o IPPM para 6 (1+1+1+1+2), apresentando uma variação de 20% !     Isto não é um processo inflacionário é apenas uma alteração em um preço devido a um fator específico.

                 De forma inversa, vamos supor que todos os outros produtos tenham seus preços elevados para 1,25.  O IPPM  subiria para 7 (1,25 X 4 +2), apresentando uma variação de 16,66% (7/6-1).  Isto é inflação.  Agora, por hipótese, imaginemos que um astuto governante, para segurar a "inflação", decida desonerar o cigarro, fazendo que seu preço volte para R$1.  Então o IPPM continuaria em 6 (1,25 X 4 +1), apresentando uma variação de 0%.  Acabou a inflação ?   Não !!

               O objetivo deste exemplo é ressaltar a importância de se olhar a inflação como um processo que é marcado pela alta generalizada de preços e que necessariamente tem um cunho monetário.  O fato de um índice de preços apresentar uma variação mais alta ou mais baixa em determinado momento é pouco relevante, já que preços podem ser afetados por fatores externos (eg. quebra da safra americana de grãos, guerras no golfo pérsico, etc.).   O que a autoridade monetária e os economistas devem fazer é observar a dinâmica.


         No gráfico acima, vemos a evolução do índice de difusão do IPCA,  Este índice indica qual o percentual de produtos da cesta que apresentou alta.  Vemos que, em janeiro de 2013, aproximadamente 75% dos produtos que compõem o IPCA apresentaram elevação de preços.  É fácil observar que este é um dos piores resultados desde o início do sistema de Metas de Inflação, só superado pelo período no final de 2002, quando o dólar chegou a bater R$ 4.     

            Outro destaque no gráfico é que o índice de difusão está em clara tendência de alta, o que pode ser percebido pela sua média móvel de 12 meses (linha preta).

             Tudo isso para dizer, que a manifesta preocupação parece tardia e que medidas paliativas de desoneração reduzem a variação nos índices de preços mas não combatem o processo inflacionário.
               Olhando o gráfico acima, onde temos a variação acumulada em 12 meses do IPCA (em preto) e de alguns grupos de produtos vemos claramente que: o que contribui para conter a inflação, desde 2010 foram os preços administrados (controlados pelo governo) e os bens tradeables (aqueles que tem seu preço determinado pelos mercados globais).  No lado superior do gráfico vemos que os grupos que mais contribuíram para a inflação foram os "serviços" e os "nontradeables", que são aqueles produtos cujos preços não dependem do mercado internacional.  Apenas, para não me acusarem de tendencioso, os serviços compõem a maior parte dos nontradeables.

                 A conclusão clara é que a variação nos preços no Brasil foi contida apenas pelo desaquecimento global e pelas determinações governamentais.   Para mim, isto tem cara de processo inflacionário.

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