Ontem, durante o dia vimos na internet a crítica
de que a “política monetária não pode ser a única salvação da crise”. Também não são poucos, alguns meus amigos,
que criticam fortemente o Quantitative Easing americano e o Europeu que está
por vir. A questão é: estas críticas
são justas? E, independentemente da
resposta anterior, algo mais pode ser feito?
O mundo vai sair da crise?
A
título de preâmbulo vamos lembrar um pouco os dados e a história da recente
crise global. O fato é que até 2008 a
alavancagem do setor privado (bancos, empresas e famílias) bateram níveis
elevados, por exemplo, nos EUA o endividamento das famílias chegou a quase 130%
do PIB, enquanto no Reino Unido foi acima de 150% do PIB. (ver gráfico
abaixo retirado de do texto da Mckinsey:
Debt and Deleveraging: Uneven Progress on The Path to Growth” de jan/2012)
Enfim a chamada crise do “subprime” não passou de um estouro numa grande bolha
creditícia, processo muito estudado por economistas e portanto, bastante
conhecido (vale a leitura do livro do Galbraith sobre a crise de 1929).
Acontece que o processo de desalavancagem tende a criar uma espiral desinflacionária,
ou seja, os preços tendem a cair e as pessoas passam a adiar ainda mais o consumo e, a medida que
fazem isso, aumentam ainda mais o desemprego, os preços caem ainda mais, as
pessoas adiam mais o consumo... Ben Bernanke,
o presidente do FED é um economista que estudou isso em profundidade e que
entende claramente este e risco e que o papel de um Banco Central nesta hora é
garantir que isto não aconteça emitindo tanta moeda quanto necessário. Assim surgiu o QE – 1.
Lógico
que medidas econômicas são envoltas em interesses políticos e econômicos, e
naquele momento, o setor financeiro que corria grande risco de colapsar apoiou
todas as medidas de expansão monetária, fazendo o possível para que elas também
atingissem objetivos particulares (moral hazard).
De qualquer maneira, Keynes
ressuscitado das catacumbas, também alertava para a questão da demanda agregada
(para os leigos: demanda agregada é consumo total de um país, dado pela soma do
consumo das famílias, dos investimentos das empresas e dos gastos do governo) e
da importância do gasto governamental.
Ora, encher a economia de moeda não é suficiente, é necessário dar um
impulso na demanda. e no meio de uma recessão este impulso deve partir do
Estado através de seus gastos. No caso
americano este impulso partiu principalmente através da devolução de impostos,
do aumento da cobertura do seguro desemprego e através da salvação de
instituições quebradas. Como resultado desta
política fiscal, agravada pela queda na arrecadação de tributos, o
endividamento dos países cresceu.
No
gráfico abaixo (obtido através do FRED-St Louis Fed) vemos que enquanto o
endividamento das famílias caiu de 100% do PIB para 85% entre 2009 e 2011,
aproximadamente, o endividamento público fez exatamente o caminho inverso.
Este
preâmbulo é apenas para me permitir dizer que em grande parte a desalavancagem
global não foi concluída e que basicamente se transferiu o problema privado
para o setor público. De forma geral, isto aconteceu em vários países, que hoje
frequentam o noticiário. No site http://www.usdebtclock.org/world-debt-clock.html podemos ver uma “projeção real time”
do endividamento público de vários países.
O endividamento médio dos países da OCDE subiu de aproximadamente 75% do
PIB para quase 105% do PIB, entre 2007 e 2011. O da Espanha subiu de 36% do PIB
em 2008 para 73% do PIB (segundo conceito de Maastricht, fonte FMI).
No “Monitor Fiscal” do FMI, divulgado em julho de 2012, vemos que o
déficit público médio das economias ditas avançadas deve ficar em 5,8% do PIB
em 2012. O déficit americano será ao
redor de 8,2% do PIB !! E apesar dos
grandes déficits a economia global derrapa, com as “economias avançadas”
crescendo apenas 1,4% e área do Euro apresentado uma queda de 0,3% no PIB.
Este
conjunto de alto endividamento, alto déficit público e baixo crescimento limita
o poder de ação dos governos, principalmente do lado fiscal. Não há espaço para mais incentivos fiscais
nas principais economias mundiais. O que
Bernanke percebeu é que se o FED deixar de fazer sua parte, deixando que a
economia americana volte a desaquecer, o fantasma da espiral deflacionária
voltará a assombrar.
Evidentemente
que o QE3 - a emissão monetária - não salvará o mundo. Também é claro que o efeito de um novo QE é
menor que os dos anteriores. Mas, existem poucas opções. Não há espaço para aumento
nos gastos públicos e o déficit público americano só não é maior por que os
juros reais estão negativos, graças aos QE’s.
Sem eles, se o juro real americano ficasse positivo em 1% a.a. (mais ou
menos a média histórica) o déficit público americano aumentaria em 2% do PIB ao
ano.
Com poucas contas é fácil perceber
que, dado o nível de endividamento das economias avançadas e a expectativa de
crescimento, com juros altos a relação DIV/Pib de vários países se tornaria
explosiva. Soma-se a isso a
impossibilidade de se fazer ajustes fiscais significativos, sem abalar o frágil
crescimento econômico, e temos uma
grande limitação de instrumentais de política econômica.
Concluindo: ruim com QE, pior sem
ele!
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Para
o Brasil o efeito mais visível da expansão monetária alimentada pelos
principais Bancos Centrais do Mundo (FED – EUA, BOJ – Japão, BoE – Inglaterra,
ECB – Europa) é a tendência de valorização do Real.
O
que não é visível e difícil de medir são os efeitos positivos sobre a balança comercial brasileira, a
medida que a expansão monetária ajuda a sustentar os preços de commodities,
principal item de nossa pauta de exportação.
Também é difícil de dizer o que aconteceria com nossa economia caso o
desaquecimento econômico global fosse ou viesse a ser mais intenso...
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Meu
primeiro chefe, certa feita, me passou uma tarefa que era criticar certo
trabalho, eu jovem, impetuoso (no auge de minha sabedoria aos 16 anos de idade),
debrucei-me intensamente sobre aquele trabalho encontrando múltiplos defeitos
que eu não hesitei em demonstrá-los. Ao
entregar a conclusão de meu estudo meu chefe me falou: “Perfeito, muito
bom! Mas, como solucionar os problemas.
O objetivo de uma crítica é melhorar o trabalho, sem isso ela é inútil. Então, sempre que me trouxer um crítica, me
traga alternativas para solução junto.”
Esta lição ficou para sempre. O
trabalho eu refiz, e percebi que algumas das soluções que eu critiquei não eram
as excelentes, mas as possíveis e que eu era incapaz de propor solução melhor.
Descobri também que eu não era tão esperto quanto eu pensava...