quinta-feira, 26 de abril de 2012

O CAMINHO MAIS FÁCIL: TRÂNSITO, CÂMBIO E COTAS


Em São Paulo a desculpa mais comum para atrasos é o trânsito, que justamente naquela hora estava terrível.  Ora, os paulistas já sabem que o trânsito em São Paulo é ruim e sujeito a muitas surpresas, logo, a culpa não é nunca do trânsito, mas do incauto que deixou de sair cedo para seu compromisso.   Mas, imagine só chegar atrasado a uma reunião falando a verdade: “saí em cima da hora pois estava surfando na internet” ...
É sempre mais fácil escolher desculpas fáceis e prontas, que eliminam a responsabilidade por mais esforços.   Contudo, uma análise mais detalhada revela a verdade.
A taxa de câmbio é a desculpa esfarrapada mais conhecida.  Empresários jogam a culpa da falta de competitividade no câmbio.  O governo incorpora a desculpa.  Todos felizes.  Empresários que anulam a competição externa e podem manter suas margens elevadas e o governo que deixa de fazer uma reforma tributária e de investir em infraestrutura fica em sua zona de conforto gastando mal os recursos públicos.  
Aqueles mais velhinhos – como eu – lembram-se como era o mercado de automóveis antes da abertura, iniciada pelo Governo Collor, e do plano Real que permitiu a valorização do câmbio. Aqueles ainda um pouco mais velhos lembrarão da proibição de importação de produtos de informática.   Vivíamos nos tempos da caverna, enquanto o mundo avançava a passos largos para o século XXI.  Mesmo assim, o câmbio ainda era um dos culpados de plantão.
A taxa de câmbio é um ótimo culpado de plantão. Uma minoria articulada repete, publica e divulga que a taxa de câmbio está destruindo empregos e a indústria nacional. Pronto! O governo articula políticas para desvalorizar a moeda, dividindo a conta entre uma maioria silenciosa, cujas preocupações mais imediatas se relacionam apenas indireta e de forma pouco clara com o câmbio.  Sem perceber, esta maioria paga um imposto, que vira subsídio.  Um subsídio recebido pelos empresários que gritaram e que agora ficam felizes.  A “máquina governamental” fica feliz, pois manteve seu status quo, pois não precisou reduzir seus custos, nem aumentar sua produtividade trabalhando mais.  Ficam felizes milhares de servidores indicados por padrinhos, as vezes inconfessáveis, ficam felizes policy makers que podem fugir do embate político.
A questão das cotas raciais é parecida.  Antigamente, quem fazia FUVEST não precisava identificar sua cor para participar do vestibular,  entravam aqueles que tinham as melhores notas.  Não consigo ver racismo nisso.  Posso não gostar e não gostava.  Fiz colégio técnico não tinha menor chance de entrar na USP sem fazer cursinho e não tinha tempo para cursinho pois trabalho desde os meus 15 anos de idade.  Posso não achar “justo” comigo, mas o processo de seleção era democrático. Hoje meu filho presta vestibular e tal qual um judeu caçado por nazistas precisa se identificar, sou branco!  Os autores deste tipo de política esquecem que o primeiro passo para o racismo é “carimbar” as raças.   
Similarmente às cotas raciais, as cotas para estudantes de escolas públicas também são distorsivas.  Por exemplo, no cursinho (caro) que meu filho faz, há estudantes – que não trabalham –  e fizeram escola pública que terão, apesar de ao fazerem cursinho e se equipararem, o benefício de cotas ou aumento de nota.  Isto é justo ?
O que a política de cotas esconde é uma verdade mais importante.  A escola pública, na média, é sofrível.  De novo, jogar a culpa no racismo é um caminho fácil.  De um lado “uma liderança” abraça a causa, se elege e reelege, mamando no estado, precisando apenas balançar, de vez em quando, a bandeira da causa.  De outro lado, o corporativismo político-estatal se coloca na zona de conforto e continua pagando mal a professores e outros profissionais ligados a educação,  enquanto os casos de desperdício do dinheiro público enchem páginas de jornais.  Ainda hoje, ouvi no rádio que um dos Ministros do Supremo defenderia a tese de que as cotas não eram problema, pois muitas vezes, nem são preenchidas, e por isso, ele seria a favor delas. (??????????) 
Falta coragem de se dizer as cotas apenas servem para mascarar um sistema de ensino abandonado pelo setor público.  Podem professores viver e ensinar adequadamente com salários miseráveis ?  Pode haver livros com erros crassos de português?  Pode um aluno passar de ano, sem aprender a ler?  Pode um aluno passar de ano, sem saber tabuada?
Cotas são aberrações que servem para perpetuar um péssimo sistema de ensino, que por sua vez serve para sustentar em seus cargos políticos inescrupulosos.
Cotas e taxa desvalorizada de câmbio são caminhos fáceis, para quem não quer mudar o país, aumentando sua competitividade que ademais só pode ser alcançada pelo aumento da produtividade resultante da melhora do capital humano (educação), da infraestrutura e da eficiência do Estado.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Juros e Câmbio: Transferindo Renda

É fácil criticar a política econômica e seus condutores, seja no Banco Central ou na Fazenda,  afinal , tais como torcedores que criticam o técnico de seu time, temos nossas opiniões e preferências e não somos cobrados por elas.  

Talvez a taxa de câmbio melhor para mim seja R$ 1,75/dólar, para um exportador talvez seja R$ 2,20, para um importador talvez seja R$ 1,50.  A taxa de juros ideal para mim (que sou poupador) seria de 15%, mas para quem toma dinheiro a melhor taxa talvez seja  5%.
As críticas se constroem com base nestas preferências em face às escolhas dos “policy makers”.   Neste sentido, como resultado da opinião de cada um, todas as críticas são válidas.   Contudo, ao analista econômico sério cabe apenas explicitar quem são os ganhadores e perdedores de determinadas escolhas de política econômica e explicitar incoerências de objetivos e métodos da política econômica.
Podemos, grosso modo, definir a política econômica atual em 3 pilares:
 - Redução da taxa de juros real;
- Preservação de uma taxa de câmbio mais elevada (um real menos valorizado);
- Políticas industriais através de subsídios setoriais, barreiras comerciais e direcionamento do crédito público.
A redução da taxa de juros  - para um nível ainda desconhecido – tomada ceteris paribus desincentiva a poupança e incentiva os investimentos.  Assim, se de um lado a poupança das famílias tende a se reduzir e o consumo a aumentar e de outro os investimentos crescem é de se esperar  um aumento no déficit em conta-corrente, ou em outras palavras, haverá a necessidade de importação de “poupança”.
A preservação de uma taxa de câmbio mais elevada, em termos reais, implica na redução do poder de compra do salário (redução dos salários reais), desincentiva importações e beneficia exportações.   Há, entretanto, efeitos colaterais dados os métodos ou caminho escolhido para atingir este objetivo, que é o de dificultar a entrada de capitais. 
Ao se restringir entrada de capitais gera-se um claro conflito de objetivos.  Para crescer mais, precisamos importar “poupança” e bens de capitais. Sem a poupança externa e sem importações de bens de capitais limita-se o potencial de crescimento.
Na questão cambial um aspecto relevante, já citado neste post e pouco observado por comentaristas econômicos, é que a escolha por uma taxa de câmbio específica é também uma forma de distribuição de renda, dos consumidores para os “industriais” ou o inverso. Não há sentido em mudanças nominais na taxa de câmbio, portanto, qualquer condução da política cambial visa uma certa taxa de câmbio real que implica em aumento ou redução dos salários reais, ponto.
Quanto a forma da “política cambial”, a opção por restringir a entrada de capitais tem o objetivo de tentar reduzir o custo para o tesouro de acumular reservas e como efeito colateral reduzir a oferta de capitais para o setor privado, então, o resultado é uma transferência do custo da política econômica para o setor privado.
Para amenizar o efeito colateral negativo – menor entrada de capitais – o governo tenta aumentar o crédito através das instituições oficiais, Caixa, BB e principalmente BNDES.  Este último, ganhando massa através da capitalização com recursos do Tesouro.
Finalmente temos a política industrial, que através de subsídios e barreiras comercias (a competidores).  Este tipo de política implica na escolha de setores “vencedores” e “perdedores”,  aqueles que merecem e os que não merecem.  Então, por exemplo, se reduz o IPI sobre a linha branca e não o da cerveja, se dá benefícios para a fabricação de ipads no Brasil, mas não se reduz o imposto de renda da classe média.  Enfim, é uma questão de escolha.
O problema das escolhas e preferências é que elas são, em geral, resultado simples da opinião/juízo de valor de alguém (ou alguns) e, portanto, na essência contestáveis, já que, como disse, opinião cada um tem a sua.  Do ponto de vista da Teoria Econômica, respaldada pela experiência histórica, este tipo de política só é eficiente em estágios incipientes ou por períodos determinados, pois, caso contrário, agem com incentivos a ineficiência relativa (beneficiam setores menos produtivos a custa dos mais produtivos) reduzindo a produtividade da economia do país.
De qualquer forma, para não me alongar, objetivo deste artigo é explicitar um fato: a política econômica atual é um grande programa de transferência de renda. Aqueles que recebem estão felizes e apoiam.  Aqueles que pagam, entre eles eu, estão num puta mal-humor.
Sidão, o Mal-Humorado